Nada fará do Brasil um vencedor depois da derrota com Holanda, nem a derrota da Argentina.
O que aconteceu hoje, o delírio dos brasileiros ao ver as lágrimas de Maradona me lembrou um conto de Rubem Alves.... Relacionamento Tênis e Frescobol
"Depois de muito meditar sobre o assunto concluí que os casamentos (relacionamentos)são de dois tipos: há os casamentos do tipo Tênis e há os casamentos do tipo Frescobol.Os casamentos do tipo tênis são uma fonte de raiva e ressentimentos e terminam mal.
Os casamentos do tipo Frescobol são uma fonte de alegria e têm a chance de ter vida longa. Explico-me.
Para começar, uma afirmação de Nietzche, com a qual concordo inteiramente. Dizia ele:
"Ao pensar sobre a possibilidade do casamento, cada um deveria se fazer a seguinte pergunta: "Você crê que seria capaz de conversar com prazer com esta pessoa até sua velhice?"
Tudo o mais no casamento é transitório, mas as relações que desafiam o tempo são aquelas construídas sobre a arte de conversar.
Sherezade sabia disso.
Sabia que os casamentos baseados nos prazeres da cama são sempre decapitados pela manhã, e terminam em separação, pois os prazeres do sexo se esgotam rapidamente, terminam na morte, como no filme O Império dos Sentidos.
Por isso, quando o sexo já estava morto na cama, e o amor não mais se podia dizer através dele, Sherezade o ressuscitava pela magia da palavra: começava uma longa conversa sem fim, que deveria durar mil e uma noites.
O sultão se calava e escutava as suas palavras como se fossem música.
A música dos sons ou da palavra - é a sexualidade sob a forma da eternidade: é o amor que ressuscita sempre, depois de morrer.
Há os carinhos que se fazem com o corpo e há os carinhos que se fazem com as palavras. E contrariamente ao que pensam os amantes inexperientes. Fazer carinho com as palavras não é ficar repetindo o tempo todo: "Eu te amo".
Barthes advertia: "Passada a primeira confissão, eu te amo não quer dizer mais nada".
É na conversa que o nosso verdadeiro corpo se mostra, não em sua nudez anatômica, mas em sua nudez poética.
Recordo a sabedoria de Adélia Prado: "Erótica é a alma".
Tênis é um jogo feroz. O objetivo é derrotar o adversário. E a sua derrota se revela no seu erro: O outro foi incapaz de devolver a bola.
Joga-se tênis para fazer o outro errar. O bom jogador é aquele que tem a exata noção
do ponto fraco do seu adversário, é justamente para aí que ele vai dirigir sua cortada.
Palavra muito sugestiva - que indica o seu objetivo sádico, que é o de cortar, interromper, derrotar.
O prazer do tênis se encontra, portanto, no momento em que o jogo não pode mais continuar porque o adversário foi colocado fora de jogo.
Termina sempre com a alegria de um e a tristeza de outro.
Frescobol se parece muito com o tênis: dois jogadores, duas raquetes e uma bola.
Só que, para o jogo ser bom, é preciso que nenhum dos dois perca.
Se a bola veio meio torta, a gente sabe que não foi de propósito e faz o maior esforço do mundo para devolvê-la gostosa, no lugar certo, para que o outro possa pegá-la.
Não existe adversário porque não há ninguém a ser derrotado.
Aqui ou os dois ganham ou ninguém ganha. E ninguém fica feliz quando o outro erra.
O erro de um, no frescobol, é um acidente lamentável que não deveria ter acontecido.
E o que errou pede desculpas,e o que provocou o erro se sente culpado.
Mas não tem importância: começa-se de novo este delicioso jogo em que ninguém marca pontos...
A bola: são nossas fantasias, irrealidades, sonhos sob a forma de palavras.
Conversar é ficar batendo sonho pra lá, sonho pra cá...
Mas há casais que jogam com os sonhos como se jogassem tênis.
Ficam à espera do momento certo para a cortada.
Tênis é assim: recebe-se o sonho do outro para destruí-lo, arrebentá-lo, como bolha de sabão...
O que se busca é ter razão e o que se ganha é o distanciamento.
Aqui, quem ganha sempre perde.
Já no frescobol é diferente:
o sonho do outro é um brinquedo que deve ser preservado, pois se sabe que, se é sonho, é coisa delicada, do coração.
O bom ouvinte é aquele que, ao falar, abre espaços para que as bolhas de sabão do outro voem livres ao vento. Bola vai, bola vem - cresce o amor...
Ninguém ganha, para que os dois ganhem.
E se deseja então que o outro viva sempre, eternamente, para que o jogo nunca tenha fim..." Rubem Alves
Eu sou Brasileira e amo a Argentina! Sou do mundo, não tenho rivalidade com ninguém....nem numa partida de futebol.
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